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Building peace in the minds of men and women

Grande Angular

Rádio: uma salvação para os povos indígenas

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A comunidade Ixil-Maia defende ativamente a sua identidade cultural e linguística.

Como meio de comunicação preferido para a defesa dos direitos dos povos indígenas, as estações de rádio comunitárias não são necessariamente de fácil acesso, apesar dos compromissos assumidos pelo Estado. Muitas estações de rádio indígenas não têm outra opção que não seja operar ilegalmente.

Avexnim Cojti e Agnes Portalewska

Há lugares no mundo onde transmitir a sua voz pode colocá-lo na ilegalidade, bem como defender seus direitos como pessoa indígena pode lhe custar a vida. Em 21 de setembro, Juana Ramírez Santiago, uma líder comunitária de origem Ixil-Maia de 57 anos, tornou-se a 21ª ativista de direitos humanos a ser assassinada na Guatemala em 2018. Ela foi uma daquelas líderes com uma visão política e um desejo de mudar a sociedade para garantir uma vida melhor para suas famílias e comunidades. A maioria dos guatemaltecos acredita que seu assassinato, como muitos outros, ficará impune.

Victoria Tauli-Corpuz, relatora especial das Nações Unidas para os Direitos dos Povos Indígenas – que visitou oficialmente a Guatemala duas vezes no mesmo ano – expressou preocupação sobre os despejos forçados, a criminalização e a violência contra os povos indígenas que defendem seus direitos e suas terras. Referindo-se aos assassinatos de sete defensores, durante e logo após sua visita em maio de 2018 [11 defensores foram mortos entre maio e julho daquele ano], ela observou: “Todos eram representantes de duas organizações de agricultores indígenas que defendiam o direito à terra e a participação política. Os assassinatos ocorreram em um contexto nacional mais amplo de um pernicioso fechamento de espaços para a sociedade civil”.

Em seu Relatório à 39ª sessão do Conselho de Direitos Humanos (de 10 a 28 setembro de 2018), ela escreveu: “Soma-se a essa situação o número crescente de acusações criminais – supostamente na ordem das centenas – que são registradas na Guatemala contra líderes indígenas e membros da comunidade. A participação ativa de entidades privadas nas acusações implica que os promotores e juízes estão em conluio com empresas e proprietários de terras em alguns desses casos”.

O papel do rádio

As estações de rádio de comunidades indígenas desempenham um papel crucial na defesa do direito à liberdade de expressão dos povos indígenas. Oferecendo a maneira mais eficaz de disseminar informações sobre questões que afetam as comunidades, elas também revelam notícias da violência que os atinge. São as primeiras a divulgar informações sobre os incidentes e a entrevistar e transmitir os pontos de vista de líderes comunitários sobre esses atos de violência. As estações de rádio apoiam publicamente os defensores da terra e dos direitos humanos, e conscientizam o público sobre sua criminalização. Esse foi o caso da Rádio Xyaab’ Tzuul Taq’a, uma startup dos Maias Q’eqchi em El Estor, que apoiou vários defensores arbitrariamente acusados e presos pelo governo por suas atividades relativas a direitos humanos e direito à terra.

Um direito frustrado

Muitos países latino-americanos consagraram na legislação o direito de os povos indígenas terem seus próprios meios de comunicação. No entanto, embora muitos Estados tenham se comprometido a atribuir frequências a essas mídias, isso geralmente não é implementado. Várias rádios de comunidades indígenas são forçadas a transmitir sem uma licença, mesmo depois de solicitar uma frequência, conforme exigido pela lei – e veem seus voluntários serem processados por suas atividades de radiodifusão.

Na Guatemala, por exemplo, o direito dos povos indígenas ao seu próprio meio de comunicação é garantido pela Constituição e pelo Acordo de Paz assinado em 1996, colocando fim a uma guerra civil que durou mais de 30 anos. Contudo, as licenças são tão caras que as rádios comunitárias sem fins lucrativos não têm dinheiro suficiente para pagar por elas. Em 2003, uma frequência custava 2 milhões de quetzales (US$ 274.000,00) por uma frequência modulada (FM) em áreas fora da Cidade da Guatemala e Quezaltenango, a segunda maior cidade do país. O custo atual é desconhecido, uma vez que os leilões públicos foram interrompidos nos últimos anos, embora as frequências ainda sejam vendidas ilegalmente por seus proprietários. Para os pequenos agricultores, esse montante é mais do que podem pagar. Com um salário de US$ 80 a US$ 120 por mês, comprar uma frequência é um sonho inatingível  .

Descolonizar mentes

A rádio provou ser capaz não somente de mobilizar os povos indígenas, mas também de influenciar políticas e responsabilizar governos. As estações de rádio organizam auditorias sociais sobre as despesas orçamentárias dos governos municipais em comunidades indígenas, por exemplo. Elas também organizam campanhas sobre o voto consciente. Na época das eleições, os candidatos são convidados a realizar debates no ar e a responder perguntas do público. Esse espaço público para responsabilizar os políticos reduz a margem de manipulação do voto.

Os meios de comunicação comunitários indígenas são poderosos recursos para descolonizar as mentes e criar um senso de orgulho cultural e linguístico. A rádio pode ser eficientemente usada para destacar músicas e conhecimentos ancestrais, e para informar as pessoas sobre as formas de organização local que atualmente são ameaçadas pela globalização e pela visão de mundo imposta pelas grandes corporações internacionais de mídia.

O meio se provou particularmente positivo nas áreas remotas da América Latina, onde o flagelo do analfabetismo impede que as populações indígenas acessem informações de fontes impressas e onde as pessoas mais velhas, especialmente as mulheres – que raramente sabem a língua dominante – são incapazes de obter informações a partir das estações de rádio tradicionais.

Por último, mas não menos importante, a sobrevivência das línguas indígenas depende em grande parte dos falantes nativos e de sua capacidade de falar fluentemente. Nesse sentido, os meios de comunicação indígenas podem e devem desempenhar um papel decisivo. 

Saiba mais

Borrero, R.M. Indigenous Peoples and the Information Society: Emerging uses of ICTs. Um documento preparado para o evento de revisão WSIS+10. Paris, UNESCO, 2016.

Radio as a platform for dialogue. An interview with Caroline Vuillemin

Dia Mundial do Rádio

Foto: Daniele Volpe

Agnes Portalewska

Gerente de comunicações na Cultural Survival, Agnes Portalewska (Polônia) é formada pela Universidade de Massachusetts – Boston e pela Universidade Brandeis (Estados Unidos).

Cultural Survival, uma instituição sem fins lucrativos sobre direitos dos povos indígenas, com sede em Cambridge, Massachusetts (Estados Unidos), tem apoiado uma rede mundial de mais de 800 estações de rádio indígenas desde 2005.

Avexnim Cojti

Gerente de programa comunitário na organização Cultural Survival, Avexnim Cojti (que faz pertence à comunidade Maia K’iche na Guatemala) lidera um programa de apoio aos esforços dos povos indígenas na defesa de suas identidades, terras e direitos humanos, estabelecendo parcerias com estações de rádios comunitárias indígenas e fornecendo a elas ajuda finance.